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Prêmio Mulheres no Mercado

Euclides e Rosa, os sertões de cada um

À Sombra do Catulo

Haicais

Outro Sol: muitos sóis.

Ave, Nélida

Do Poder da Palavra: Ensaios de Literatura e Psicanálise        

Sonhos e Simetria

 

 

Os Caminhos da Ficção Curta

 

 

Caio Porfírio Carneiro

 

Jeanette Rozsas é ficcionista que escreve com grande espontaneidade. Não diz isto muita coisa, levanto-se em conta que muitos escritores de valor assim se comportam. O que se dá é que, em Jeanette, a espontaneidade se envolve em sutilezas, pequenos mistérios e sustos. Tudo isto ao correr da narração, sem ênfase ou impactos maiores.

Eis porque as emoções, aqui, palpitam fortemente, nascidas da vida cotidiana, tão plenas de surpresas e de fragilidades continuadas.

         É uma maneira curiosa de contar, quase em conversa despretensiosa. E é aí onde se ilumina cada história, com perplexidades e surpresas criadoras, que calam fundo na alma do leitor; e é aí onde o psicológico, irmanado ao correr das histórias, não se revela de todo, antes se corporifica em sombra ou aura, benfaseja ou malfaseja, conforme o tema abordado, da primeira à última frase de cada conto e do livro no seu todo.

         A autora conta como quem “não quer dizer nada com isto”, tal a simplicidade do seu mistério criador. Mas o seu talento treliça e destreliça situações plenas de sensações dos desencontros da vida.

         Sempre em meios-tons, centrando-se mais no “panorama” da classe média de aparência bem comportada e sem acidentes maiores, Jeanette extrai o sal da terra e expõe aos olhos de todos os entrechoques humanos.

         Com estas poucas ferramentas nos mostra de que barro somos feitos. Não põe dedos em feridas. Põe dedos para dedilhar as emoções que se guardam, às vezes, em tantos falsos segredos. Tais segredos irrevelados, quantas vezes por imposições sociais, levam a autora a envolver algumas histórias em fumos (como diria Mestre Machado) de mistérios, em solidões em família, em hesitações e aflições amorosas, aprofundando, muito mais e ao revez, a realidade das próprias histórias.

          Em alguns contos a autora se alonga mais e em outros é elíptica, o que é mais uma demonstração, para além do tema abordado, do seu domínio total do gênero. Qual é mesmo o caminho de Swann? é uma pequena obra-prima da arte de contar. E o que dizer de Setsuan e de Violoncelo?  O que dizer, enfim, de cada uma destas peças curtas? A variedade de emoções e perplexidades é muito grande. É o amor, o desamor, o mistério, a insegurança, a solidão etc., tudo dentro de um voleio de sortilégios e buscas de alguma coisa, quanta vez não localizável, porque são buscas da alma humana. A paisagem, o visual, os ambientes, são sempre nitidamentes impressionistas, e por trás desse abrir de cortina pulsa o universo de conflitos miúdos marcadamente universais.

         Jeanette Rozsas pouco muda o tom e o tônus narrativo, seja na primeira ou terceira pessoa. O que muda - e como muda... - é o enfoque emocional; o que exsurge são os achados, os detalhes rápidos, às vezes numa linha apenas, ampliando grandemente o veio ficcional. É do talento da autora, quase diria do seu inconsciente criador.

         Qual é mesmo o caminho de Swann? é ponto alto da melhor ficção curta da atualidade. Obra que pede melhor atenção da crítica e do público ledor da boa literatura nacional.

         É tão fácil comprovar... Bastará ler o livro.

         (Editora 7 Letras (coleção rocinante), Rio, 2005).

         Caio Porfírio Carneiro é escritor, crítico literário e secretário administrativo da União Brasileira de Escritores.